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A Dignidade do Homem

As sociedades do mundo ocidental construíram-se e assentam sobre o pilar da dignidade da pessoa humana, em todas as dimensões da sua vida, tanto individual  como relacional.

Este valor é espelhado e “garantido” nos dias de hoje, por meio das grandes declarações elaboradas no contexto da ONU (Organização das Nações Unidas), da OEA (Organização dos Estados Americanos) ou do Conselho da Europa que reconhecem os direitos humanos como direitos naturais e basilares, inerentes a qualquer ser humano e catalisadores da convivência pacífica entre indivíduos.

O art. 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão elaborada pela ONU, em 1948 é claro: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e de consciência e devem agir uns para com os outros num espírito de fraternidade”. “A dignidade da pessoa humana deve ser uma referência constante da análise que se faça e na solução que se procure" (Manuel Clemente, em ECCLESIA 15/3/2007), é fonte de todos os direitos e critério de orientação dos restantes princípios, direitos e deveres.

A dignidade é um atributo da pessoa humana.

Simplesmente pelo facto de ser um humano torna-se merecedor de respeito e proteção, não importando para isso a sua idade, estado de saúde, raça, origem, condição socioeconómica e sexo, e existe desde a conceção até à morte natural. É nesta vida humana que “todos os aspetos e momentos da vida do homem adquirem pleno significado” (São João Paulo II, na Evangelium Vitae).

Da dignidade para a produtividade

A sociedade em que vivemos atingiu elevados patamares de desenvolvimento político, tecnológico e científico que permitem, como nunca, o pleno desenvolvimento da pessoa humana, mas caracteriza-se também pelo individualismo axiológico expresso na vida em solidão, sem comunidade a apoiar e que apoie cada ser humano. A produção de bens foca-se no lucro e no consumo, alheados do homem e da sua dignidade,

situando o fim do homem em ser produtor e consumidor, acabando quase por coisificar o homem.

As ciências, com os seus avanços magníficos desacompanhados de uma reflexão filosófica e ética igualmente avançada, permite que o próprio homem possa ser considerado um produto que pode ser manipulado. Em paralelo, a dignidade da pessoa humana resvala lentamente da consideração de atributo da pessoa, pela única razão de ser pessoa, para atributo de qualidade da vida humana, segundo critérios do próprio indivíduo ou de terceiros, qualidade cuja ausência ou diminuição é sinónimo de menor dignidade.

Do direito à vida ao direito à morte

Assim encontram justificação atentados à vida humana, descriminalizando condutas, a pretexto da liberdade individual, esquecendo existencialmente os mais indefesos, os mais frágeis ou os que vivem em solidão enquanto vivem, reconhecendo-lhes já não o direito à vida, mas o direito à morte. 

As novas legislações acabam mesmo por se afastar dos princípios bases das suas constituições, onde a dignidade do ser humano é assegurada, e “reconhecer a plena legitimidade de tais ações contra a vida” (São João Paulo II, na Evangelium Vitae). 

Do sentido de pertença para a marginalização

A alteração de paradigma que temos vindo a observar, leva a uma profunda mudança na maneira de encarar o ser humano, a vida e a relação entre os homens. Com estas alterações tem-se vindo a perder o sentido de pertença a uma comunidade e a noção de que o desrespeito pela dignidade de um só ser humano afeta toda a comunidade porque o ser humano é um ser em relação. Assistimos a uma derrocada moral, onde respeitar, defender e assegurar a dignidade e a vida de qualquer ser humano já não é essencial e começam a escalar os atos contra as pessoas. Alguns são colocados à margem, excluídos e não valorizados pelo que são, mas como são ou estão.

Este é um fundamental desafio dos nossos dias em que constantemente o valor da vida humana é colocado em causa: pessoas em situações mais débeis e indefesas veem a sua vida ameaçada e desrespeitada,

como é o caso das crianças não nascidas, das pessoas com deficiências ou dos idosos. Neste fenómeno não podemos esquecer “os graves problemas demográficos, sociais ou familiares — que incidem sobre numerosos povos do mundo” (São João Paulo II, na Evangelium Vitae), como é o caso do que se passa atualmente no Afeganistão, na Ucrânia, nas fronteiras da Polónia e da Roménia, no Mediterrâneo, com os refugiados em muitos lugares do mundo, entre outros, onde se eliminam tantas vidas humanas. 

Da violação da dignidade humana ao seu reencontro

Assim, nunca é demais reafirmar o valor da vida humana e a sua inviolabilidade. São João Paulo II na Evangelium vitae, sintetiza as realidades do século XXI em que a dignidade do ser humano é violada: “Tudo quanto se opõe à vida, como seja toda a espécie de homicídio, genocídio, aborto, eutanásia e suicídio voluntário; tudo o que viola a integridade da pessoa humana, como as mutilações, os tormentos corporais e mentais e as tentativas para violentar as próprias consciências; tudo quanto ofende a dignidade da pessoa humana, como as condições de vida infra-humanas, as prisões arbitrárias, as deportações, a escravidão, a prostituição, o comércio de mulheres e jovens; e também as condições degradantes de trabalho, em que os operários são tratados como meros instrumentos de lucro e não como pessoas livres e responsáveis. Todas estas coisas e outras semelhantes são infamantes; ao mesmo tempo que corrompem a civilização humana, desonram mais aqueles que assim procedem, do que os que padecem injustamente”.

Apesar de toda esta alteração de paradigma, evolução da sociedade e da perda de muitos valores basilares, o homem continua a procurar a sua felicidade, a busca de um sentido para a sua vida e não desiste, nem pode desistir de lutar pela sua dignidade. É importante que tenhamos a consciência do sentido de comunidade, também na busca desse sentido, procurando mostrar os motivos por que vale a pena viver.

Por fim, para respeitarmos o outro e a nós mesmos a fórmula é: “respeita, defende, ama e serve a vida, cada vida humana!

Unicamente por esta estrada, encontrarás justiça, progresso, verdadeira liberdade, paz e felicidade!” (São João Paulo II, na Evangelium Vitae).

Mafalda Silva

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